Viver de Fantasias – Por Leonardo de Magalhaens – #temporadadetextos

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         Conheci C. num show de rock. Noite estrondosa. Chuva e trovoada e som pesado. Heavy metal thunder. Morena, olhos pintados, rainha egípcia. Cabelos em cachos, lábios gloriosos. Toda dressed to kill. Ofereci um drink, ela aceitou. Tudo começou aí. Me lembro bem.

         Nos beijamos no corredor que vai do bar aos WCs. Ela não perdia tempo – se deixava amassar e me agarrava as bolas. Odiava aquela calça jeans. Pouco se importava com os outros que passavam. Um outro casal, de garotas, se devorava sob uma escada em caracol. Solos de guitarra e arrepios. Uma versão pesada de Nick Cave. Depois uma vocalista ruiva que lembrava algo de Nightwish e Evanescence.

         Mas quem disse que C. me deixava curtir o show? Ela queria todas as atenções. Com a mão morena na minha nuca, mordia a minha boca. Dentes vampíricos. Ela queria sangue – não? Depois do show corremos para a minha casa. Os motéis não aceitavam mais. Preços em órbita.

         Em casa nem acendemos a luz. Foi um ataque devastador. Uma luta feroz no ringue. Fui jogado nas cordas. Meu cinto voou longe. A calça jeans quase se rasgava. Depois do combate corpo a corpo tomamos uma ducha. 

         Foi só o começo. Pouco sabia sobre C. e continuava assim. Era Galoucura ou China azul? Era católica ou crente? Era mesmo solteira? C. não dava trégua. Nossa única linguagem era o corpo. Pouco importava posição política, nossas posições eram outras e múltiplas.

         Descobri que ela já tivera uma girlfriend. Ah, a C. Era mesmo fluída. Reencontrou a ex numa boate. A ex, dona de um brechó no Barro Preto. Era muito descolada, mais pop mais dance. E C. não escondia – ela era tremendamente sincera. Falava na cara e na hora! Às vezes preferia que ela mentisse.

         Uma noite estávamos, eu e C. num inferninho – e quem apareceu? A ex de C., a louca G., lançava chamas nos olhos. Vivia de fantasias. E que mulher! Não perdoava nem boys nem girls. Lá tocava um Massive Attack ou Moby, é só o que me lembro.

         Acabamos os três num motel da Praça Sete e foi inenarrável aquela batalha noturna de braços e pés, de dedos e línguas. C. sugava sua louca G. enquanto se alternavam em meus braços. Inesquecível noite de outrora!

         Não voltamos a encontrar a louca G., nem a C. a procurou. O plano de C. era outro e ela armava táticas e estratégias. Queria dois boys de uma só vez. Ela assim queria – e eu negaria? No ônibus, ela travou conhecimento com um tal S., um funcionário de estatal. Jovem, altino, de pouca fala, mas de olhar sedutor. Sua beleza já dizia tudo.

         Nem precisou de um show ou balada. Marcamos num fim de expediente. Uma sexta-feira. Eu e o sedutor S. brincávamos alucinados com a insaciável C., até que nos descobrimos. Ele me ensinou como deveria fazer. Sem palavras. Sem competição para saciar a mulher – para nos saciar. E foi uma de nossas longas noites.


#LeonardodeMagalhaens      

Poeta, escritor, crítico literário, revisor , tradutor, Bacharel em Letras pela Fale/UFMG

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