Tempos ácidos


Aprovando o uso emergencial de duas vacinas, a Anvisa comprovou sua independência e recuperou a credibilidade do Instituto Butantan e da Fiocruz. A ciência derrotou o charlatanismo e o voluntarismo das autoridades responsáveis pela coordenação do combate à pandemia.

Depois de mais de 200 mil mortes, de mais de 8,5 milhões de pessoas confirmadas com a infecção e de outras morrendo por falta de oxigênio no Estado do Amazonas, renasceu a esperança de dias melhores Brasil afora.

Entretanto, o sonho de ver controlada a pandemia é simplesmente um sonho. O lote de vacinas, que virá da Índia, é pequeno, e a importação da matéria-prima para a fabricação da Coronavac ainda é incerta. Assim, certa é a paralização da imunização.

Por enquanto, cerca de 4,5 milhões de brasileiros serão imunizados nas próximas semanas, representando apenas 2,8% da população de 18 anos e mais, que é o contingente-alvo total da cobertura, se todos forem vacinados.

Obviamente, não se deve esperar ter previamente em estoque as 325,7 milhões de dose, quantidade necessária para imunizar todos, mas o Brasil já deveria ter garantido o fluxo de importação e produção, se houvesse gestão, planejamento e coordenação de ações. As autoridades federais menosprezaram o perigo da pandemia.

A resistência e a improvisação em relação à vacina têm efeitos perversos também sobre a economia, que empurrou para o desemprego e a pobreza milhões de brasileiros. Agora, a principal política econômica é a vacinação. O crescimento será tão mais rápido quanto mais curto for o tempo e mais eficiente for a cobertura vacinal; hoje, há grandes incertezas.

Enfim, vivemos tempos ácidos. A pandemia chegou ao Brasil em momento difícil, com a economia estagnada e com os políticos se engalfinhando por migalhas de poder, derramando ódio e difundindo mentiras, sem nenhuma responsabilidade com as vidas das pessoas e com o destino da nação.

Esperamos que as lideranças políticas e as autoridades responsáveis pelas principais instituições do país, acima de suas aspirações pessoais, de suas vaidades e de seus objetivos políticos e eleitorais, com humildade e responsabilidade, se unam e cuidem agora do bem comum; que tenham compaixão com os que já morreram e vão morrer, com suas famílias, e com os brasileiros que perderam seus empregos, suas rendas e seus sonhos.

Não há mais tempo para picuinhas, disputas vãs e blá-blá-blás. É tempo para enfrentar o presente, com altivez e seriedade; não é tempo para apontar culpados, mas para agir solidariamente com responsabilidade pública para liderar, organizar e executar o programa de imunização. As instituições democráticas correm sérios riscos, se tudo continuar como está.

Como o estado de calamidade é a antessala do estado de defesa, 2021 antecede 2022.

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