O nostálgico como ponto de fabulação da ideologia fascista – Por Leonardo Vieira Rodrigues – #temporadadetextos

Fonte: Pixabay

 

O presente texto se propõe a discutir o fascismo a partir do conceito de nostalgia como ponto inicial para a sua idealização. Nesse aspecto, iremos problematizar a ideia de nostalgia, e como esse pode ser apropriado por uma ideologia que inventa um passado, que justifique sua ideologia. No caso desse ensaio, iremos aproximar a ideia de nostalgia junto ao fascismo para entendermos os fenômenos no mundo contemporâneo, como, por exemplo, a exaltação ao militarismo, a crença a um imaginário de virilidade masculina, sobretudo, o racismo como forma de justificar uma doutrina que crê na superioridade de uma raça, e a imposição da teoria de que algumas são inferiores as outras. Mostraremos a definição do termo na perspectiva de Leandro Konder e Robert Paxton. Num segundo momento do texto teremos a análise sobre o fascismo no século XXI, e sua percepção distorcida da vida coletiva e sobre o papel do homem na sociedade. A primeira definição aqui apontada está presente no escrito de Robert Paxton intitulada A anatomia do fascismo (2007), em que ele assim define: 

A palavra fascismo vem do fascio italiano, literalmente, um feixe ou um maço. Em termos mais remotos, a palavra remetia a faces italiano, um machado cercado por feixe de varas que era levado diante dos magistrados, nas procissões publicas romana, para significar a autoridade e a unidade do Estado. (PAXTON, R, 2007, pag. 15).

A passagem citada indica que a origem se remete ao estado romano, o último grande império do ocidente do mundo antigo. Um feixe fechado que representa o poder, o estado e por consequência, um ideal de civilização. O grande perigo reside justamente na idealização, que no fascismo de Mussolini entendia que alguns grupos deveriam ser executados. No texto Paxton, tem-se a descrição que antes de 1914 a esquerda se apropriava da simbologia dos fasces romano, que era retratada como uma força de solidariedade republicana contra seus inimigos aristocráticos. Porém, ao longo do século XX, em 1919, um grupo nacionalista de esquerda se juntou ao ex-socialista e pária social Benito Mussolini em prol da (liga revolucionário de ação intervencionista), que tinha no grupo também intelectuais ligados ao movimento poético futurista, que juntos celebraram uma guerra ao socialismo, após efetivação do movimento ligado a Benito Mussolini. Temos aí a semente de um regime político totalitário que como apontou Hannah Arendt, em As origens do totalitarismo (2004), na qual Arendt entende que foi um fenômeno peculiar e único na política do século XX, pelas suas especificidades em ser anti-semita (no caso do nazismo), e perseguir grupos compreendidos como esquerdas, e outras minorias. As outras formas de regimes entendidas com ditaduras, e não como formas de governos totais no quesito de supressão das liberdades individuais.  

Em outro texto que trata do assunto do fascismo intitulado Introdução ao fascismo (1979), Leandro Konder entende que a ideologia nos seus valores de esquerda como as lutas de classes, foi apropriada pelo Mussolini, no entanto, do ponto de vista da extrema-direita para justificar as ações truculentas do fascismo. Segundo ele: “[…] o fascismo foi – pragmaticamente— buscar ideias no campo do inimigo. Numa direita apavorada com a revolução proletária, era natural o impulso de macaqueá-la, “assimilando-a” desfigurada para tentar neutralizá-la.” (KONDER, Leandro, 1979, pag. 7). Na perspectiva do autor citado o fascismo é o resultado do medo da burguesia para com os ganhos dos trabalhadores, essa ameaça advinda do proletário fez com surgisse fascismo, que foi apoiado pela burguesia italiana. Na Alemanha o fenômeno do fascismo tomou contornos próprios que foi denominado como nazismo, mais, é um regime nacionalista totalitário e que impingia um tipo de sociedade, de homem e de moral a ser impostas para “limpar” a sujeira, e a corrupção de grupos e pessoas que não estavam dentro do ideal propagado pela extrema-direita italiana de Mussolini, ou mesmo, o nazismo.  

O que se tem, tirando as experiências de Itália e Alemanha são elementos do fascismo em outros lugares do mundo, sobretudo no momento atual de sociedade capitalista financeira que passa por uma crise. É, nessas variantes do fascismo, encontram-se modelos políticos que se utilizam de milícias com setores do militarismo do Estado, para combater possíveis insurreições dos trabalhadores, e outras minorias, um papel fundamental para adestrar os corpos pobres era ressaltar o individualismo via utilização do poder das vozes dos líderes religiosos. Isso tem acontecido no Brasil atual em que algumas igrejas neo-pentecostais agem como linha auxiliar ao poder federal que tem a ideologia de extrema-direita em sua perspectiva de percepção de forma de poder com pitadas de fascismo. O momento atual do mundo é de crise do sistema capitalista, na qual propicia o surgimento de líderes políticos pouco afeitos ao exercício da democracia e se mostram simpáticos para com algumas práticas do fascismo, algo que aconteceu nos Estados Unidos da América de Trump, na Bulgária e atualmente no Brasil.  

A crise atual do capitalismo na sua nova veste neoliberal, não só tem feito surgir presidentes que zombam da estrutura da democracia liberal, e que adoram evocar em seus discursos elementos do fascismo para provocar seus opositores, e mesmo aumentar o engajamento daqueles que os admiram. Além disso, nesse tempo de crise capitalista tem despertado a sensação nas pessoas médias a crença em regimes autoritários, como o único caminho para salvar um capitalismo que não se dobra na resolução das questões das desigualdades sociais que é histórica no Brasil. Junto à crença em regimes autoritários tem-se-aí a invocação no ideal da masculinidade que se encontra na estética militar. Acredita-se que a estética militar é medida comportamental para não declinar ao rebaixamento moral e suscetível a corrupção. Seria essa força estética capaz de lutar contra quem assimila comportamentos morais que se dizem progressistas, mas só rebaixam a condição humana? Bem essa pergunta deve estar na cabeça das pessoas que acreditam nos valores da nova extrema-direita brasileira que se faz crer como guerreiros contra a corrupção. Enfim, são apenas delírios, que presumem que o ideal estético de vida é uma mistura de autoritarismo militar com cristianismo cheio de velhos preconceitos para com qualquer forma de diferença. Visto ainda, que os assimilados pelos valores da atual extrema-direita, evocam um passado tecido por uma fabulação que se pinta como estritamente séria e sem envolvimento em qualquer forma de corrupção, bem assim querem acreditar o que foi a ditadura militar de um passado histórico recente do país. Diante dessa pequena amostra sobre uma perspectiva política ideológica fica uma pergunta: O mundo é realmente do jeito que as pessoas pensam? Apesar de a minha pessoa acreditar que as pessoas constituem a sua percepção da realidade dentro dos contornos que o faça acredita, e que seja menos sofrida para si. O questionamento sobre a percepção deve ser encarado por todos ou qualquer indivíduo que esteja respirando e vivendo nesse mundo atual.

Que outras veredas estejam em nossos horizontes, pois o presente se mostra trágico para a humanidade.

 

Referência Bibliográfica:

ARENDT, Hannah. As origens do Totalitarismo. São Paulo: Ed. Companhia das letras, 2004.

KONDER, Leandro. A introdução ao fascismo. Rio de Janeiro: Ed. Graal, 1979.

PAXTON, Robert. A anatomia do fascismo.

Leonardo Vieira Rodrigues

Leonardo Vieira Rodrigues

Professor de Filosofia e História. Atualmente leciona em Guarulhos-SP para estudantes do Ensino Médio e Ensino Fundamental. É também pesquisador da Filosofia em temas como estética e política. É mestre em Estudos de Linguagem pelo CEFET-MG.

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